A preocupação sobre o coronavírus (SARS-CoV-2) e a doença respiratória aguda a ele atribuída (COVID-19), que levou à declaração de pandemia pela OMS, levanta questões e receios sobre a sua transmissão.
Luciana Cipriano
Nutricionista
No que se refere à alimentação em particular, e tendo em consideração todos os estudos científicos levados a cabo até ao momento, não existe evidência de qualquer tipo de contaminação através da ingestão de comida cozinhada ou crua. As organizações internacionais com maior notoriedade na área (OMS, EFSA, FDA) e em Portugal a DGS, já vieram afirmar que os alimentos não são veículos de transmissão do SARS-CoV-2. Contudo, e aplicando o princípio da precaução, o reforço das medidas de higienização, no que aos alimentos se refere, é altamente aconselhado, assim como relativamente a qualquer outra “superfície” de contacto. Destaca-se o reforço das seguintes boas práticas de higiene nas nossas cozinhas:
- Lavagem frequente e prolongada das mãos (com água e sabão durante 20 segundos), seguida de secagem apropriada evitando a contaminação cruzada (por exemplo fechar a torneira com uma toalha de papel ao invés da mão que a abriu enquanto estava suja);
- Desinfeção apropriada das bancadas de trabalho e da mesa com produtos apropriados;
- Evitar a contaminação entre comida crua e cozinhada;
- Cozinhar e empratar a comida a temperaturas apropriadas e lavar adequadamente os alimentos crus;
- Evitar partilhar comida ou objetos entre pessoas durante a sua preparação, confeção e consumo.
Podemos reforçar o sistema imunitário através de algum alimento específico?
A lavagem das mãos, as medidas de etiqueta respiratória e de distanciamento social serão sempre as medidas mais importantes para prevenir a propagação da doença por novo coronavírus (COVID-19). A evidência científica é escassa no que diz respeito à relação entre alimentação e o reforço do nosso sistema imunitário, não existindo, até ao momento, nenhum alimento específico ou suplemento alimentar que possa prevenir ou ajudar no tratamento da COVID-19. Contudo, sabemos que um estado nutricional e de hidratação adequados contribuem, de um modo geral, para um sistema imunitário otimizado, para um melhor prognostico e para uma melhor recuperação dos indivíduos em situação de doença. Portanto, e apesar de não existirem “poções mágicas” capazes de ajudar nesta doença, sabemos que à semelhança de outras funções fisiológicas do organismo, para garantir o normal funcionamento do sistema imunitário, é necessário uma alimentação equilibrada, com a presença de diferentes nutrientes, e que podemos facilmente encontrar quando seguimos as recomendações da Roda dos Alimentos.
Que tipo de cuidados devemos ter na nossa alimentação?
Mais do que nunca, é importante cumprirmos com uma alimentação saudável! Quando fizer a sua lista de compras privilegie os alimentos de elevado valor nutricional, e certifique-se que está a respeitar a nossa Roda dos Alimentos, fazendo uma alimentação completa, variada e equilibrada tendo como base os seguintes grupos alimentares:
- grupo dos Cereais e derivados e tubérculos – Almoço/jantar: arroz, massa, batata; Pequeno-almoço e merendas: muesli, flocos de milho ou aveia, pão de preferência integral ou mistura (poderá congelar ou porque não comprar farinha e fazer o seu próprio pão? As crianças vão adorar esta ideia).
- grupo dos hortícolas – deve ser dada preferência aos que apresentam uma maior durabilidade, privilegiando os produtos frescos. Ter sempre à mão: cenoura, cebola, courgette, abóbora, brócolos, couve-flor, feijão-verde, alho, pimentos, couve galega e outros hortícolas de folha verde e tomate. Caso tenha receio em consumir hortofrutícolas crus, poderá então usar 1 c sopa de solução clorada (ex: lixívia) por cada l/água e deixar em imersão durante 15 min. Seguidamente lavar abundantemente por água corrente. Os produtos hortícolas congelados são também uma boa opção uma vez que as suas propriedades nutricionais são mantidas na congelação. Coma sempre sopa de legumes ao almoço e ao jantar.
- grupo da fruta – coma pelo menos 3 peças de fruta da época por dia. Em destaque as variedades com maior durabilidade: maçã, pera, laranja e tangerina e tentar ter em casa frutos vermelhos e kiwi.
- grupo da carne, pescado e ovos, destacam-se os ovos como alimentos que apresentam uma boa durabilidade, uma elevada riqueza nutricional e que não necessitam de estar armazenados no frigorifico. Sugestões: ovos mexidos , omolete com cogumelos, ou tomate cherry, pimentos e salsa, ovos escalfados com espinafres. As conservas de pescado também podem ser utilizadas para algumas das refeições. Tanto a carne como o pescado podem ser adquiridos quer em congelado ou fresco, contudo os frescos devem ser utilizados para os primeiros dois/três dias.
- grupo das leguminosas (feijão, grão, ervilhas, lentilhas…), tanto as versões em conserva como as secas podem ser opções a considerar. As leguminosas são fontes importantes de fibra e proteína , e podem ser alternativas à carne e pescado. Experimente fazer algumas refeições sem carne/pescado. Aproveite para recuperar a tradição do feijão, do grão e das ervilhas à nossa mesa.
- grupo dos lacticínios – preferir leite com baixo teor de gordura, bebidas fermentadas como kefir, iogurtes (magros e sem adição de açúcar) e queijos com baixo teor de gordura.
- grupo das gorduras – evite ao máximo o abuso nas gorduras e principalmente os fritos. Privilegie o uso do azeite para temperar e confecionar os seus alimentos. E porque não usar o azeite nas suas torradas em vez de compotas, mel, manteiga ou outros cremes vegetais?
- Água – a água da rede pública é adequada para consumo, logo pode ser um produto a dispensar no seu carrinho de compras. Beba água ou outros líquidos não açucarados ao longo do dia (mínimo 8 copos de água/dia). Manter um bom estado de hidratação é essencial.
Pelo seu elevado valor nutricional poderá também incluir na sua lista de compras as oleaginosas (nozes, amêndoas, avelãs) mas advirto para o facto de serem de elevado valor energético pelo que deverão ser consumidos com moderação.
Para terminar, não se esqueça de manter as suas rotinas diárias para preservar a sua sanidade mental e física. Esforce-se por continuar a fazer exercício físico e a comer de forma saudável. Cumpra os horários habituais das refeições, evitando snacks ao longo do dia, principalmente os mais ricos em sal e açúcar (bolachas, batatas e outros fritos de pacote, chocolates, gomas, etc). Que este período em que estamos mais por casa, não seja um estímulo ao consumo de alimentos processados, de baixo valor nutricional, e de elevada densidade energética, até porque as nossas taxas de obesidade já são preocupantes e não queremos piorar esta situação. O melhor mesmo é evitar comprar para não ter à disposição esses alimentos que nos podem desencadear um consumo compulsivo, pois já se sabe que a “fruta proibida é a mais apetecida” e “longe da vista, longe do coração!”. Naqueles momentos em que a vontade excede a razão, então não resista e deixe deliciar-se com pequenas doses do seu maior prazer alimentar, tentando não exceder as 100 kcal. Existem imensas soluções para si … Investigue os rótulos e analise a informação nutricional dos seus “pecados favoritos”.
Apesar de todo o lado negro desta pandemia, mesmo diante das situações negativas, há sempre sementes que apontam para o bem. Haverá sempre algo bom e positivo por detrás desta situação. No meu caso eu encontrei a possibilidade de estar a 100% com a minha família. Tentemos então procurar em cada lar o que de mais bonito temos e nos está a ser oferecido. Não é todos os dias que temos a oportunidade e tempo para cozinhar com os nossos filhos ou em casal. Neste período em que estamos todos por casa e em família, porque não usar algum do nosso tempo livre para ensinar os mais novos, e porque não o nosso cônjuge, a cozinhar de forma saudável? Fica a dica!
Artigo escrito com base nas Orientações e medidas recomendadas pela OMS, DGS, Ordem dos Nutricionistas e ASAE.
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